domingo, 21 de agosto de 2011

Estamos mesmo ficando moralistas?

Em 1988, a personagem Maria de Fátima aprontou todo tipo de maldades, mas terminou ao lado de seu amante César Ribeiro em um acordo nupcial bastante escandaloso com um príncipe distante. Era um triângulo amoroso moderno movido por dinheiro. Tudo certo, ninguém pensou em puni-la. Vinte e três anos depois, a mesma atriz interpreta uma ingênua enfermeira que é presa ao ser enganada pelo namorado, corrompida pelo ódio e maus tratos na cadeia, se transformando em uma vingadora sem escrúpulos. Tanto que acaba provocando a morte de seu marido rico. Dessa vez, os autores acham mais ético puní-la e, faltando três capítulos para o final, Norma é assassinada gerando o oitavo "Quem matou?" da carreira de Gilberto Braga.

O próprio autor declarou que Norma precisava ser punida por seus crimes. E Maria de Fátima não? A moral e bons constumes reinou em Insensato Coração como não se via há muito tempo em telenovelas. A garota Cecília, por exemplo, vivida por Giovanna Lancelotti caiu na lábia do "bad boy" Vinícius de quem engravidou. Mas, na reta final ela perde o bebê e o vínculo com o marginal em uma das decisões mais chocantes na trama. Afinal, não fez muito sentido a visita da garota ao ex na cadeia para pedir que ele ficasse "longe do filho". Como também não fez sentido o empurrão dele, e a forma fácil com que ela perdeu a criança. Basta comparar com a já citada Maria de Fátima que rolou da escadaria do Municipal para perder o bebê que esperava de César e não conseguiu. Parecia que os autores queriam mesmo poupar a menina e o personagem Rafa, seu namorado, de criar o filho de um marginal.

Outra situação moralista foi o desenrolar do personagem André, mulherengo convicto que teve seu pecado pago com um câncer nos testículos. Aliás, toda a cena de descoberta da doença foi vergonhosa. O rapaz não teve nem a chance de se regenerar com sua amada Carol, Camila Pitanga, que acabou casando mesmo com Raul, Antônio Fagundes. Parece que a moral só não falou mais alto no caso da personagem Natalie de Débora Secco que não apenas ficou rica, como se elegeu deputada federal em um misto de crítica às mulhres frutas eleitas e Tiririca, já que ela chegou a citar a famosa frase do palhaço na campanha: "O que faz um deputado? Também não sei, mas vota em mim que eu te conto".

Voltando àa Norma, é interessante perceber como Glória Pires tomou a novela para si. A personagem se tornou protagonista absoluta da trama, sendo sua trajetória de vingança muito mais interessante do que o insosso romance de Pedro e Marina. Até por isso, sua morte foi tão surpreendente e, por algum lado, frustrante. Tanto esforço acabou em três balas disparadas em seu peito por Wanda, uma mãe jocastiana em defesa do seu pimpolho querido. Mas, nem tudo acabou na terça-feira. Mais surpreendente que descobrir que Wanda matou a quase nora, foi perceber que Norma já tinha deixado seu plano de vingança arquitetado. Ela iria mandar prender Léo e ele seria morto na cadeia por Cortez. Norma só não contava ser morta e não poder desfrutar de sua vingança.

Entre erros e acertos, Insensato Coração não é das piores novelas que já foram exibidas no horário nobre como muitos estão afirmando. Tem uma boa estratégia e sempre grandes diálogos, marca de Gilberto Braga que Ricardo Linhares está acompanhando, claro que há exceções, como no caso já citado da doença de André, mas no geral, acompanhamos bons momentos como a cena em que Eunice conversa com o marido Júlio, por exemplo, logo depois de chegar da delegacia. Ou a sutileza da cena entre Wanda e Raul, com a revelação da falsa morte de Léo. Uma novela que não deixa muitas saudades, mas marca uma época em que o politicamente correto e a faixa indicativa de horário dominam o conteúdo televisivo.

4 comentários:

Daniel Pepe disse...

Essa resolução da trama da Cecília realmente foi bem forçada. Acho que a novela valeu pela trajetória da Norma, inclusive por esse desfecho de já deixar a morte de Léo planejada. E também por ter dado a Glória Pires a oportunidade de um papel mais polêmico que os anteriores.

Amanda Aouad disse...

Pois é, Daniel, a trama de Norma foi o que funcionou na novela, com Glória Pires muito bem no papel. Mas, muita coisa podia ser melhor. Uma pena.

wigvan disse...

Gostei muito do seu blog, Amanda.

Amanda Aouad disse...

Obrigada, Wigvan. Só precisa ter mais tempo para escrever mais aqui.